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O Clima da Região de Lisboa

Capa
Autor(es):
ALCOFORADO, Maria João
Páginas:
347
Ano Publicação:
1992
ISBN:
972-636-094-3

O Clima da Região de Lisboa (PDF formato pdf, 21 977 KB)

Publicação esgotada

Resumo

RESUMO GERAL E PRINCIPAIS CONCLUSÕES

No fim de cada capítulo resumiram-se os aspectos tratados e sintetizaram-se as conclusões parciais que permitirão – espera-se – uma leitura rápida do presente estudo. Far-se-á, aqui, um breve apanhado das principais conclusões e uma apreciação crítica dos vários métodos e técnicas usados. Em cada capítulo, ficam inúmeras interrogações e pistas para novas pesquisas.

Para a investigação do clima à escala local, é necessário um estudo regional prévio, empreendido na primeira parte.

O estudo dos ventos mostrou que os fluxos de Oeste são os mais frequentes, em altitude, sobre a região estudada. À superfície, as massas de ar chegam fundamentalmente de Oeste e de Nordeste no Inverno e, no Verão, do quadrante Norte. Na estação de Lisboa (Geofísico) o rumo Norte é francamente preponderante, seguido pelo de NE no Inverno e pelo de NW, nos meses de Junho, Julho e Agosto. A frequência dos ventos de SW não alcança 20%o no Inverno nem 10%o no Verão. Em todas as estações meteorológicas, observa-se, a partir do mês de Março, um aumento dos ventos de Norte (e NW), nitidamente dominantes durante o Verão. Este facto reflecte-se na vegetação, sendo a deformação das árvores utilizada para a representação cartográfica dos ventos dominantes em torno da Serra de Sintra (capítulo 8). Concluiu-se também que, nalguns locais de observação, o rumo do vento depende essencialmente da topografia local: Santarém (ventos de NE e SW), Ota (Norte e NW), Dois Portos (NW e SW), Paiã (SW e NE), Oeiras (Norte e Sul), Sesimbra (NW, SW e NE).

Comenta-se, em seguida, a variação da insolação e das grandezas que contribuem para a modificar (nebulosidade e nevoeiro), pois é da variação da insolação e dos ventos que dependem os contrastes térmicos sobre os quais se centrou o estudo. As médias mensais da razão de insolação são desprovidas de significado no Inverno, uma vez que a distribuição deste parâmetro é bimodal; no Verão (altura em que a distribuição apresenta uma dissimetria negativa) a média é mais próxima da moda. Por isso, foram utilizados valores diários (de 40 anos) no estudo da razão de insolação em Lisboa (Geofísico), embora o mesmo não tivesse sido feito para o conjunto da região. Foi apurado que, em Lisboa, tanto de Verão como de Inverno, os dias de céu limpo são mais frequentes do que os de razão de insolação ≤0.20. Há, em Lisboa, mais dias de Sol constantemente descoberto do que em muitas estações do Sul da França, conhecidas pelas suas excepcionais condições de insolação no Inverno. Também se averiguou que as sequências de céu limpo são mais compridas do que as sequências de céu encoberto: a mais longa sequência de dias de Sol alcançou 11 dias em Dezembro, 9 em Janeiro, 12 em Fevereiro e 9 em Março, enquanto as de mau tempo não ultrapassaram, respectivamente 7, 7, 6 e 5 dias, nos quarenta anos estudados. Os dados diários de insolação, não divulgados habitualmente, são os únicos utilizáveis em termos aplicados (fins turísticos, energia solar) por fugirem ao carácter abstracto dos valores médios mensais ou anuais.

Foi esboçada uma comparação das particularidades do ritmo da insolação com elementos da circulação sinóptica, embora se tenha chamado à atenção para o seu carácter hipotético, no estádio actual da pesquisa. Citou-se, como exemplo, na conclusão parcial, o mês de Abril de insolação média bastante superior à de Março e de mais 6% de dias de céu limpo do que o mês de Março, o que poderá ser devido a uma diminuição do número de perturbações em circulação zonal. Mas este mesmo mês, pode, em certos anos, apresentar sequências de mau tempo, relativamente longas; propôs-se como explicação para este facto a ocorrência de determinadas circulações de bloqueio que, quando ocorrem, facilitam a permanência dos centros depressionários causadores de mau tempo à superfície.

Considera-se que seria útil, de futuro, a construção de calendários de probabilidade da razão de insolação para o maior número possível de estações portuguesas, como foi feito para Lisboa. Em França, uma vez reconhecida a sua aplicação prática nomeadamente no aproveitamento de energia solar, os calendários têm vindo a ser sistematicamente publicados.

Foram estabelecidas relações lineares, simples e múltiplas, entre a razão de insolação e o número de dias de nevoeiro e de nebulosidade forte. Estas revelaram-se significativas para os meses de Verão e permitiram calcular a razão de insolação em estações meteorológicas desprovidas de heliógrafo. No Inverno será necessário um tratamento da informação diária para substituir os valores médios, por exemplo, pelos das modas.

O estudo das temperaturas incidiu sobre a série centenária do Instituto Geofísico (Lisboa) e sobre as temperaturas máximas e mínimas médias mensais de 28 estações meteorológicas da região estudada. Concluiu-se ter havido, em Lisboa, um aumento global mas muito irregular de temperatura. As máximas médias mais elevadas ocorreram na década 1935-1945, como em muitos outros locais da Europa. Os valores mais altos da temperatura mínima observaram-se mais cedo: nos anos 10-20 deste século; houve uma ligeira diminuição posterior, seguida de um aumento recente. O aumento de temperatura determinado a partir de uma regressão simples foi de 1.2ºC nos dois casos. As séries demasiado curtas das outras estações meteorológicas da região de Lisboa apenas permitiram assinalar os Verões e Invernos particularmente quentes e frios do período recente (1947/48-1974/75), de que se estudou o regime estacional.

Sendo a distribuição da temperatura próxima da distribuição normal, o regime médio tem significado. O regime foi estudado também em termos de frequências, tendo-se construído calendários de probabilidade da temperatura de diferentes períodos, referentes a Lisboa (Geofísico). Delimitou-se o período quente do ano entre 1 1 de Julho e 1 de Setembro, altura em que as temperaturas máximas ≥32ºC têm uma representatividade de 5% e as ≥30ºC de 10%. A dispersão das temperaturas mínimas é muito menor do que a das máximas, no Verão, e a amplitude térmica diária é a mais elevada do ano (em 10% dos dias ≥14ºC). A diminuição das temperaturas máximas, no fim do Verão, é mais precoce do que a das mínimas, e o arrefecimento outonal é mais rápido do que o aumento de temperatura, na Primavera. Chamou-se à atenção para o «Verão de S. Martinho» que adquire significado estatístíco com determinada amostragem de temperaturas máximas. O Inverno é curto: só de meados de Dezembro até ao fim de Janeiro, a frequência de ocorrência de temperaturas baixas permanece constante e elevada. A 1 de Janeiro, há 15% de probabilidades das temperaturas mínimas serem inferiores a 4ºC. O aumento das máximas inicia-se a meados de Fevereiro, enquanto as mínimas permanecem baixas até ao início de Março. A subida de temperatura primaveril é, como já se disse, mais lenta e, também, mais irregular do que a descida no Outono, observando-se a maior irregularidade interanual no mês de Abril. Um estudo estatístico das primeiras e últimas datas de ocorrência de temperatura ≤5ºC (cerca de 0ºC ao nível do solo), revelou que os riscos de geadas precoces e tardias (as mais perigosas para a agricultura) são inferiores a 5%.

A partir de uma análise em componentes principais, as estações meteorológicas foram ordenadas em função das médias das suas temperaturas máximas e mínimas e, dentro de cada conjunto, segundo as particularidades dos seus regimes térmicos. Para quantificar a variação das temperaturas máximas e mínimas com a distância ao litoral, a altitude e a latitude, foram utilizadas regressões múltiplas. Embora alguns dos resultados sejam comuns, as duas técnicas revelaram-se complementares, uma vez que a primeira sintetiza a informação contida nas matrizes iniciais e a segunda precisa o papel de cada factor climático, a vários momentos do ano. A variação latitudinal não tem praticamente influência na temperatura. Com a distância ao mar, aumentam muito as máximas de Verão (coeficiente de correlação de + 0.8) e diminuem as mínimas de Inverno (coeficiente de correlação de – 0.5). A influência da altitude é maior nos dias de Inverno do que no Verão, não ocasionando diminuição importante das mínimas de Inverno. A análise dos resíduos permitiu verificar a influência dos efeitos urbano e topográfico, não tomados em conta pelo modelo. O primeiro manifesta-se no aumento das temperaturas mínimas, maior no Verão do que no Inverno. A posição topográfica deprimida do local de observação provoca uma forte diminuição da temperatura mínima, principalmente no Inverno, mas que também ocorre no Verão.

Para apreender melhor a realidade climática, passou-se ao estudo dos dados diários: analisaram-se matrizes de temperaturas máximas e mínimas de cerca de 250 dias e 250 noites de Verão e de Inverno, de 20 estações meteorológicas. Uma análise em componentes principais permitiu distinguir os dias em função dos valores das suas temperaturas e dos padrões de distribuição térmica. Os grupos de dias de semelhante distribuição espacial da temperatura foram relacionados com as condições aerológicas correspondentes. Nalguns casos, foi possível determinar quais são as características da circulação regional que mais afectam a variação espacial da temperatura do ar. Noutros, foi apenas observada a simultaneidade de ocorrência de fenómenos de várias ordens, sem estabelecer uma relação causal entre eles. No fim do capítulo 4, detalham-se as conclusões sobre as causas da hierarquia térmica dos dias e noites de Verão e de Inverno, e são comentadas as situações de mais fortes e mais fracos contrastes térmicos. Por exemplo, no Inverno, tanto os centros depressionários com fluxo de Sul como os anticiclones ibero--africanos, originam temperaturas altas, embora o tipo de tempo correspondente a cada caso seja diferente. Os dias e as noites mais frias tanto podem ocorrer em situações anticiclónicas ou depressionárias, desde que o fluxo provenha das altas latitudes. Para a catalogação dos dias, do ponto de vista da situação sinóptica, adaptou-se a classificação de D. e A. de BRUM FERREIRA (1983), elaborada para o estudo da Seca Invernal em Portugal e posteriormente modificada para o estudo dos anticiclones e gotas de ar frio em Portugal por C. RAMOS (1986) e J. VENTURA (1986). Dado que as referidas classificações tinham sido concebidas com objectivos diferentes, nem sempre foi possível estabelecer uma relação de causa e efeito entre as situações sinópticas e os vários padrões de repartição térmica identificados. Para isso, foi necessária a indicação dos fluxos regional e local.

O tratamento dos dados diários permitiu individualizar três sectores de comportamento térmico particular: o Litoral, o Vale do Tejo e a Aglomeração de Lisboa. Iniciou-se, na segunda parte deste trabalho, o estudo mais pormenorizado de duas destas áreas.

Dedicou-se uma atenção especial ao clima da cidade de Lisboa, sendo o capítulo referente ao Litoral ocidental apenas uma breve apresentação de dados inéditos, colhidos no terreno, em que se pretende mostrar o interesse destes estudos em relação ao turismo estival.

Três capítulos são consagrados a Lisboa. Apesar disso, encaram-se as conclusões a que se chegou como os resultados preliminares de uma investigação que deverá ser feita com outros meios materiais e humanos.

A posição de Lisboa, à beira do estuário do Tejo e próxima do Oceano mas, ao mesmo tempo, dele isolada pela Serra de Monsanto a Ocidente, pelas elevações que constituem a Serra da Carregueira a NW e pela Serra de Sintra, mais distante, confere características peculiares ao seu clima.

Foi verificada a grande influência do relevo movimentado da cidade e dos padrões variados de morfologia urbana nos contrastes térmicos espaciais. O estudo embrionário da repartição espacial dos fumos negros, revelou que a sua concentração é maior no Inverno do que no Verão e é, nas ruas movimentadas da Baixa, cerca de 10 vezes maior do que a Norte e NE da cidade. Uma grande concentração deste tipo de poluente diminui a radiação solar directa e dificulta a irradiação terrestre: poderá portanto dificultar o aquecimento diurno e contribuir para uma menor diminuição da temperatura, à noite.

Os percursos de medição de temperatura, devidamente situados no seu contexto, revelaram alguns dos padrões de repartição de temperatura na cidade. Faz-se notar que a análise não se pretende exaustiva (para isso era necessário um muito maior número de observações) e que os padrões térmicos detectados não são forçosamente os mais frequentes. Foi, no entanto, confirmado que é, durante a noite, que a cidade é susceptível de se conservar mais quente do que os arredores próximos. A intensidade da ilha de calor urbano não parece ser muito intensa: média de 2 a 3ºC, como em Roma e Atenas. Mas circunstâncias especiais, como a ocorrência de nevoeiro no estuário do Tejo, podem elevar estas diferenças de temperatura a mais de 10ºC.

Nos dias de Verão, de vento forte de Norte, não há propriamente um efeito urbano nas temperaturas: a cidade actua como um obstáculo e os locais mais quentes são os que estão abrigados dos ventos de Norte: as áreas ribeirinhas que, por acaso, coincidem, em parte, com o centro da cidade. Em ocasiões de calma ou de vento fraco no Aeroporto, o padrão térmico espacial varia constantemente: foi referida no texto a «luta» que, nessas tardes, se trava entre a brisa que sopra de SE de manhã e, depois, roda para Sul e SW, ou que provém de SW, e o vento de Norte, cuja velocidade aumenta gradualmente durante a tarde e que, quase sempre, acaba por vencer a brisa, soprando em toda a cidade. Nas ocasiões em que os limites Sul e SW da aglomeração recebem ventos do estuário ou do Atlântico, a sua temperatura pode ser de 2 a 7ºC inferior à do Aeroporto (estação de referência). O núcleo da ilha de calor centra-se então no sector setentrional da cidade, nas «Avenidas Novas»; os desvios positivos raramente ultrapassam 1ºC. Estes resultados foram verificados por uma campanha de lançamentos de balões estabilizados, executada por uma equipa de Fribourg (Suíça) e com a colaboração do INMG, que se descreve pormenorizadamente no texto.

Nas noites de Verão, observa-se um aumento de temperatura, em direcção ao centro da cidade. Nas noites de vento forte do quadrante Norte (cerca de 40%) os bairros a Sul e SE da Aglomeração são os que se conservam mais quentes. Há grandes diferenças entre locais próximos, mas as temperaturas mais altas encontram-se nas áreas deprimidas do Centro administrativo de Lisboa (Baixa, Restauradores, etc.), sendo o vento fresco de Norte o responsável do maior arrefecimento dos interflúvios. Em 8.5% das noites (exemplo 2/8/85), quente, sem vento, mas com uma humidade muito elevada, há um aumento de temperatura em direcção ao Centro da cidade, sendo os interflúvios próximos da Baixa os mais quentes. Pensa-se que o ar marítimo ou estuarino relativamente fresco e muito húmido, circula preferencialmente pelos vales e aí se acumula, determinando a diminuição de temperatura observada. Interessa também focar que, noutras ocasiões, este ar alóctono provoca um grande arrefecimento em toda a área ribeirinha, impedindo qualquer influência da cidade nas características térmicas e higrométricas da atmosfera urbana e fazendo descer a temperatura a valores inferiores aos do Aeroporto, tal como se observou a 29/6/83; estas últimas situações deverão corresponder a 15% dos casos, mas novas observações são necessárias para o confirmar. Em noites muito quentes e secas, de atmosfera instável, que não representarão mais de 4.5% dos casos (ex: 27/7/81), a intensidade da ilha de calor ultrapassa os 4 e até os 5ºC nalguns locais. As temperaturas conservam-se mais elevadas nos fundos de vale do Centro de Lisboa. Não se verifica advecção de ar húmido e fresco; nestas ocasiões, correspondentes à ocorrência de massas de ar muito quentes e secas do continente africano, só a meio da tarde, tal costuma acontecer. Verificou-se que, apesar das diferenças que acabámos de apontar, o padrão de repartição espacial da temperatura é semelhante nos vários casos: no mapa dos valores medianos dos desvios de temperatura, nota-se a forma tentacular da ilha de calor de Lisboa e o facto do litoral oriental da cidade ser mais quente do que o litoral SW, tal como acontece durante o dia, nesta estação do ano.

Nos dias de Inverno, observaram-se dois padrões térmicos opostos. Em dias de vento fraco de Norte ou NW, notou-se um ligeiro aumento de temperatura em direcção ao Centro (cerca de 2ºC). Um padrão térmico oposto foi detectado em dias de advecção de ar frio e húmido estuarino ou mesmo de nevoeiro. Nestas ocasiões, são as áreas ribeirinhas (em que se inclui o Centro) as mais frias e húmidas, aumentando a temperatura em altitude e com a maior distância ao Tejo. Numa das ocasiões o nevoeiro limitava-se a uma estreita faixa junto ao rio; noutro dia alastrava sobre todo o sector oriental da cidade, alcançando o Campo Grande. A variação térmica espacial é, então, enorme, tendo-se observado diferenças de +10ºC entre Monsanto, onde brilhava o Sol, e Cabo Ruivo, mergulhado no nevoeiro. É proposta a frequência provisória de 6% dos dias de Inverno para este tipo de fenómeno, considerando-se urgentes novas observações.

Os percursos das noites de Inverno revelaram que, tal como no Verão, há sempre um aumento de temperatura em direcção ao Centro da cidade. A temperatura é mais elevada nos vales da Baixa lisboeta, devido à sua posição de abrigo em ocasiões de vento moderado a forte não só em noites muito frias (como 11/2/83 e 21/1/83, que representarão 9% da população) como em situações de transição (como a 8 e 10/1/83, 12% dos casos). Pelo contrário, em ocasiões de calma, embora se continue a notar um aumento de temperatura em direcção ao Centro da cidade, as temperaturas mais elevadas observam-se nos interflúvios (Largo de Camões, Campo de Ourique, etc.). Os fundos dos vales arrefe-cem mais, embora a temperatura desça menos naqueles em que a densidade de construção é maior e nos que estão mais próximos do Centro (excepto em noites de nevoeiro no Tejo). Este tipo de padrão térmico tanto ocorre com temperaturas bastante baixas (por exemplo a 17/1/83, 12/1/83, 12/3/84, 2/3/84, 27% dos casos) como em noites anormalmente quentes para a época do ano (como a 1/2/85). Numa outra noite, também relativamente quente, a grande irregularidade térmica espacial apenas permitiu delimitar duas áreas termicamente contrastadas.

O maior número de percursos de observação, em noites de Inverno, permitiu verificar a importância da morfologia urbana: nalguns sectores mais antigos e de grande densidade de construção de Carnide e da Pontinha, a temperatura pode ser igual à do Largo do Rato e pouco inferior à da Baixa, apesar da sua distância ao centro da ilha de calor urbano. Uma termografia da parte oriental de Lisboa, confirmou a maior parte destes resultados.

Procedeu-se ao estudo das variações temporais de temperatura em dois bairros de Lisboa, escolhidos como exemplo: o Bairro Alto e as «Avenidas Novas» (Av. de Berna). A análise minuciosa dos registos dos termo-higrógrafos ali instalados permitiu relacionar as variações de temperatura com os elementos meteorológicos medidos no Aeroporto. Os resultados mais fiáveis dizem respeito ao Bairro Alto. Por exemplo, no Bairro Alto, nos dias de Inverno, é a variação de insolação que comanda as diferenças de temperatura entre aquele local (que fica à sombra a partir das 14-15h) e o Aeroporto. A velocidade e o rumo do vento adquirem importância na explicação das temperaturas nocturnas aí registadas; a maiores velocidades correspondem menores desvios, talvez porque os ventos de SW (dos quais o Bairro Alto não está tão protegido) são os mais fortes nesta época do ano (média de Dezembro, Janeiro e Fevereiro de 15 km/h, no Geofísico). No Verão, a velocidade do vento tem quase sempre grande influência nas diferenças de temperatura entre o Bairro Alto e o Aeroporto (a uma maior velocidade do vento (geralmente de Norte), corresponde uma mais elevada diferença de temperatura), mas só às 16h o mesmo se verifica para a Av. de Berna (talvez por ser a hora em que a Nortada tem probabilidades de ser mais forte e, só nessa altura se notar a influência do abrigo deste local).

Os resultados do tratamento sistemático de todos os valores dos desvios estão em acordo com os das observações itinerantes: a ilha de calor é mais frequente e bem marcada durante a noite, tanto no Inverno como no Verão. Durante o dia, não se manifesta tão nitidamente a superioridade térmica a Baixa. As temperaturas máximas mais elevadas da Aglomeração observam-se, não raro, nos bairros setentrionais.

No último capítulo chama-se à atenção para a importância dos estudos do clima a grande escala no litoral e para a utilidade dos resultados para fins turísticos e outros.

Escolheu-se como exemplo, a área em torno da Serra de Sintra, relacionando as conclusões de um estudo anterior sobre os ventos dominantes (a partir de bio-indicadores), com observações itinerantes e inquéritos a frequentadores da praia do Guincho. A observação da modificação do porte das árvores (deformação) devida à acção fisiológica do vento sobre a vegetação permitiu uma representação cartográfica detalhada do trajecto dos ventos, em parte do litoral da área estudada. Concluiu-se que, a barlavento da Serra de Sintra, há uma travagem e desvio para a esquerda dos ventos de Norte e, a sotavento, uma aceleração daqueles que descem a vertente Sul. O vento dominante é canalizado pelos vales, que lhe podem modificar o rumo; representaram-se, cartograficamente, os locais abrigados: certos fundos de vales e vertentes orientadas a SE, Sul ou SW, conforme a circulação local do ar. A grande diferença de velocidade do vento entre as praias a barlavento do obstáculo e a do Guincho a sotavento, já sugeridas pela deformação das árvores foram conferidas instrumentalmente; por outro lado, observou-se que a elevação de temperatura, no litoral, de Norte para Sul a Ocidente da Serra, é forte durante o dia, mas diminui ao fim da tarde. Foi finalmente centrada a atenção sobre o tempo estival da praia do Guincho, imediatamente a Sul da Serra; pareceu interessante esta investigação, que se poderá alargar a outras praias do litoral ocidental próximo de Lisboa, onde o afluxo de veraneantes tem aumentado, devido à poluição crescente das praias da Costa do Estoril. Por inquérito e observações de várias pessoas, verificou-se que a maioria dos «bons» dias de praia (sem vento, pelo menos até ao fim da tarde) corresponde a dias em que o vento (fraco) sopra de Leste no Aeroporto, tanto à superfície como a 850 e 700 hPa. Em dias considerados «maus» (em que o vento não permite a permanência na praia), 60%odos rumos do vento observados no Aeroporto correspondem aos quadrantes Norte e NW, embora, em altitude, não se verifique uma tão grande preponderância destes dois rumos. Há poucas diferenças de nebulosidade e humidade relativa entre os dois grupos de dias considerados, mas a diferença de pressão entre Cabo Carvoeiro e Évora (diferença escolhida para quantificar o gradiente de pressão) é, em média, 2 hPa menor nos dias de bom tempo no Guincho.

O tempo é considerado mau, na praia do Guincho, nos dias de nortada, em que há uma aceleração local do vento a sotavento da Serra de Sintra. Concluiu-se também que na maior parte dos dias de Verão, o vento actua quase isolado (desde que a temperatura não seja demasiadamente baixa para a época) como factor limitante das actividades ao ar livre. Pensa-se, num futuro próximo, aplicar aqui alguns índices testados noutros locais.

Os vários percursos de medição mostraram também que, em quase todos os dias em que era impossível a permanência na praia do Guincho, o tempo estava «bom» na Praia Grande, imediatamente a barlavento do referido obstáculo montanhoso. Noutras ocasiões, quando há vento no Guincho, ocorre nevoeiro na Praia Grande (que «levanta» frequentemente ao fim da manhã).

 

A partir da experiência agora adquirida no estudo do clima de Lisboa e, com base em vários projectos em curso, propõem-se os seguintes passos na Investigação futura:

 

1 – Preparação de mapas de base (à mesma escala)

Considera-se expressivo o mapa de relevo aqui utilizado e a sua escala inicial (1: 40 000) adequada.

Será necessário preparar um mapa de densidade de construção mais actualizado do que o que aqui foi utilizado.

Para a elaboração de um mapa actualizado de ocupação do solo, prevê-se um estudo prévio em colaboração com especialistas para definir e cartografar os padrões morfológicos de toda a cidade.

2 – Escolha de técnicas de tratamento estatístico (e obtenção de meios materiais de as aplicar) que permitam agrupar automaticamente dias com tipo de tempo semelhante, com base nos valores do maior número possível de elementos meteorológicos (vento, insolação, temperatura, humidade relativa, nebulosidade, precipitação, etc.) para, objectivamente, situar as medições de terreno e calcular as frequências de ocorrência dos diversos padrões térmicos detectados. O facto de se ter utilizado o padrão regional de repartição da temperatura como elemento distintivo dos vários dias, permitiu apenas entender determinadas relações entre fenómenos e situar certas medições de terreno, uma vez que a dias de semelhante repartição térmica, podem corresponder diferentes tipos de tempo e vice-versa.

3 – Instalação de uma rede mais densa de termo-higrógrafos em abrigo em bairros-tipo, definidos a partir dos estudos referidos em 1, não só em função da morfologia urbana, como também da posição topográfica e distância ao Centro. Todos os aparelhos deverão ser da mesma marca (e do mesmo tipo), assim como os abrigos.

4 – Multiplicação de percursos de observação de temperatura, humidade relativa e ventos. Desde que se disponha de instrumentos de resposta rápida, ou, melhor, aparelhagem que, adaptada a um veículo, permita o registo das temperaturas dos termómetros seco e molhado, a 0.5 e a 1.5 m do solo, ao longo do percurso; é aconselhável a escolha de percursos E-W, tal como foi feito nas raras ocasiões em que se conseguiram as condições materiais mínimas indispensáveis.

5 – Utilização de dados de teledetecção

– Imagens de satélite (Landsat – TM OU SPOT), de grande resolução para elaboração de cartas de ocupação do solo e térmicas.

– Imagens termográficas obtidas de avião, para documentar, em pormenor os diferentes bairros (resolução 10 metros). A temperatura do ar e das várias superfícies deve ser simultaneamente medida, o que pressupõe a compra de radiómetros manuais.

6 – Investigação da estrutura dos ventos. Para isso far-se-ão observações junto ao solo com anemómetros manuais, instalar-se-ão anemógrafos em telhados de certos edifícios, serão repetidas as campanhas de lançamento de balões estabilizados, de que se deu um exemplo. Um dos objectivos prioritários, que não se conseguiu atingir na campanha de lançamento dos balões no Verão 1987, é o de detectar a espessura e outras características das brisas do Tejo e do Oceano, tão importantes na cidade de Lisboa.

7 – Continuar o estudo da poluição em Lisboa, primeiro a partir dos numerosos dados já existentes e ainda não totalmente explorados e, numa fase posterior, executar medições itinerantes de certos

poluentes; esta investigação necessita, no entanto, de meios materiais avultados.

8 – O objectivo final será a elaboração de mapas de síntese, não só em termos de valores de elementos climáticos, mas também tendo em conta as suas consequências no conforto ou no stress climático dos habitantes da cidade, problema importante que não pôde ser abordado no estudo agora apresentado.

Informação actualizada em 08/04/2024